O catador é quem manualmente coleta e separa do lixo urbano (de edifícios e casas) material passível de ser reciclado. Os termos que designam esse trabalhador variam: catador de lixo, carroceiro, garrafeiro, homem-cavalo. Esse último de modo explícito revela a crueldade das condições de trabalho experimentadas por esses trabalhadores.
Em reportagem publicada em 2008, um repórter do jornal Folha de São Paulo passou quatro dias vivendo como um catador. No artigo, o repórter narra o sofrimento físico (uma carroça de ferro pesa cerca de 90 kg) e psicológico (“mexer no lixo alheio pega fundo na autoestima”) suportados pelos catadores (Fioratti, 2008). Puxando a carroça, o catador enfrenta subidas, descidas e o trânsito nas vias urbanas carregando um peso sobre-humano. Dessa atividade, decorrem problemas físicos e psicológicos relacionados ao stress, ao excesso de peso, problemas pulmonares devido à poluição, ao contato com resíduos sem equipamento de proteção adequado. Dentre os riscos enfrentados por esses trabalhadores, ressalta-se: “a exposição ao calor, a umidade, os ruídos, a chuva, o risco de quedas, os atropelamentos, os cortes e a mordedura de animais, o contato com ratos e moscas, o mau cheiro dos gases e a fumaça que exalam dos resíduos sólidos acumulados, a sobrecarga de trabalho e levantamento de peso, as contaminações por materiais biológicos ou químicos etc” (IPEA, 2013, p.6). Por fim, atividade extremamente insalubre, perigosa e penosa que não conta com nenhuma forma de proteção.
Esse cenário de precariedade nas condições de trabalho dos catadores pode ser agravado com a incidência do uso ou convívio com as drogas. . Nessa perspectiva, Ribeiro, Nardi e Machado (2012) atestam que os indivíduos que se envolvem no trabalho de catação de resíduos estão movidos pelo propósito de sobrevivência, complementação de renda, ou, em especial, a supressão de vícios com álcool ou outras drogas. Esta proposta considera que a hipótese pode se concretizar, em especial, no caso dos catadores que trabalham nas ruas dada a maior precariedade do seu trabalho. Por exemplo, há catadores nas ruas que alugam o carro por dia do próprio atravessador, vendendo ao final da jornada os resíduos coletados, descontado o valor do carro (SILVA, 2017). Por vezes, dormem no próprio depósito do atravessador e usam a renda aferida para comprar a droga. Em tal contexto, a precariedade extrema do trabalho (inclusive, uma potencial situação de trabalho forçado em relação ao atravessador) se entrelaça com o uso de drogas. Este projeto pretende focar nesse problema, identificar os elementos que compõem essa relação e delinear possíveis princípios a serem seguidas por políticas públicas que são necessárias para se minimizar a precariedade e vulnerabilidade desse grupo.
A aproximação como o objeto da pesquisa no decorrer dos anos de 2017 e 2018, evidenciou entraves para à gestão da política pública e inquietações acerca de novas formas de se pensar a gestão da cidade de Fortaleza/CE para os catadores de resíduos e pessoas em situação de rua. Dentre os entraves constatados, um diz respeito às possibilidades de se pensar uma cidade inclusiva e sustentável, com uso de inovações tecnológicas e sociais na gestão de políticas públicas. Dessa forma, este projeto foi renovado em 2019 a fim de explorar o papel das tecnologias da informação, comunicação e inovações sociais (TICs) como instrumentos para a garantia de políticas públicas inclusivas para catadores de resíduos. As TICs podem constituir ferramentas essenciais para o incremento de políticas públicas O desafio deste projeto está na situação de exclusão não somente social das pessoas em situação de rua e catadores na rua, mas também tecnológica, considerando as seguintes questões:
De que forma políticas públicas podem utilizar inovações tecnológicas e sociais em benefício de catadores de resíduos e pessoas em situação de rua, como forma de pensar uma cidade inclusiva e sustentável?
Como as experiências internacionais de políticas de e-formality, sobre casos de boas práticas internacionais de cidades que vinculam novas tecnologias e políticas sociais voltadas para sustentabilidade e inclusão, podem contribuir para a formulação de políticas públicas no Ceará e em Fortaleza?
Em que medida novas tecnologias podem suprir os déficits de direitos sociais e de cidadania vivenciados por catadores de resíduos e pessoas em situação de rua?
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Situação Social das Catadoras e dos Catadores de Material Reciclável e Reutilizável – Brasil. Brasília: IPEA, 2013.
Fioratti, Gustavo. Na Pele de um Carroceiro. Folha de São Paulo, Revista da Folha, 2008, pp. 16-25.
Disponível on line: http://acervo.folha.com.br/fsp/2008/04/27/101.
RIBEIRO, I. M.; NARDI, H. C.; MACHADO, P. S. Catadoras(es) de materiais recicláveis e as possíveis articulações entre trabalho precário e relações de gênero. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, São Paulo, v.15, n.2, p. 243-254, 2012.
SILVA, Ana Patrícia Pereira da. Situação Social de Catadores de Materiais Reutilizáveis e Recicláveis que Trabalham no Centro de Fortaleza-CE. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – UFC, Dissertação de Mestrado, 2017.
CAVALCANTE, D. G.; GOMES, S. L. F.; GOMES, A. V. M.; MATIAS, M. L.
Vulnerabilidade e violações: um estudo sobre os catadores de resíduos ‘não-associados’ nas ruas de Fortaleza-CE, sob a ótica dos direitos humanos. In: Direitos Humanos, Grupos Vulneráveis e Violências.1 ed.Porto Alegre: Fi, 2018, v.1, p. 129-144.
DIAS, EDUARDO ROCHA: CAVALCANTE, Dieric Guimarães ; GOMES, Sarah Linhares Ferreira . DESPROTEÇÃO SANITÁRIA E PREVIDENCIÁRIA DOS CATADORES DE RESÍDUOS NÃO-ASSOCIADOS EM FORTALEZA – CE: UMA ANÁLISE SOCIOJURÍDICA DA PRECARIEDADE DE TAL ATIVIDADE. Direito e Justiça, v. 19, p. 141-160, 2019.
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DIAS, Eduardo Rocha; GOMES, Ana Virgínia Moreira ; CAVALCANTE, Dieric Guimarães ; BEZERRA, Iago. Savino ; GOMES, Sarah Linhares Ferreira . Entre a precariedade e a desinformação: uma análise da situação dos catadores de resíduos não-associados nas ruas de Fortaleza-CE.. In: XXIV – ENCONTRO DE INICIAÇÃO À PESQUISA da Universidade de Fortaleza, 2018, Fortaleza. Anais dos Encongtros Científicos – XXIV – ENCONTRO DE INICIAÇÃO À PESQUISA. FORTALEZA: Universidade de Fortaleza – UNIFOR, 2018. v. 1. p. 1-6.
Agradecemos o apoio da Diretoria de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (DPDI) da Universidade de Fortaleza, que, por meio do Programa de Apoio a Equipes de Pesquisa (Edital n. 30/2017), possibilitou a realização deste trabalho.